domingo, 5 de setembro de 2010

O que é preciso saber para fazer uma divisão?

Se você respondeu que para fazer uma divisão é preciso conhecer a tabuada e as outras três operações elementares – adição, subtração e multiplicação –, acertou... Em parte.

Para Miguel e Miorim 1 (1986), essa operação é a que mais apresenta dificuldade não só para quem ensina, mas, principalmente, para quem aprende.

Neste artigo pretende-se mostrar, por meio dos conceitos relacionados à operação de divisão, a veracidade da afirmação anterior e sugerir uma organização do planejamento da divisão nos anos iniciais da escolaridade básica.

Antes de tudo, deve-se considerar que a lista de conceitos presentes no início deste texto responde à questão que o intitula, quando a divisão é concebida exclusivamente como uma técnica operatória. Porém, há muito mais conhecimento relacionado ao conceito divisão.

Primeiramente, é fundamental que o professor proponha aos seus alunos atividades envolvendo o significado da divisão em matemática, em contraposição aos significados construídos em situações do cotidiano.

Geralmente, parte-se do pressuposto de que relacionar divisão e dividir em partes iguais já é do domínio de todos os alunos, e não se exploram as divisões espontâneas naturalmente realizadas pelas crianças em suas interações sociais. Nessas divisões, nem sempre o todo é dividido em partes iguais e nem sempre o resto deve ser menor que o divisor.

Relacionado ao significado da divisão em matemática, é essencial também propor atividades cujo objetivo seja a natureza do todo a ser dividido: contínuo ou discreto. De acordo com Miguel e Miorim (1986): “(...) um todo é discreto quando é formado por um número finito de elementos (conjunto contável ) e admite, teoricamente, que não podem ser quebrados” e “um todo é contínuo quando é formado por um número infinito de elementos (pontos) e admite, teoricamente, divisibilidade infinita (...) (p. 45).

Sendo assim, um grupo de pessoas é um exemplo de um todo discreto, enquanto um retângulo é um exemplo de um todo contínuo.

A natureza do todo interfere no ato de dividir, como, por exemplo, um grupo de 15 pessoas só pode ser dividido em 1, 3, 5 ou 15 partes iguais, enquanto um pedaço de barbante pode ser dividido, teoricamente, em qualquer número de partes iguais.

Outro aspecto relevante para a aprendizagem da divisão envolve as duas idéias relacionadas à divisão: a idéia de repartir e a idéia de medir; que se relacionam a diferentes contextos de problemas.

A primeira dessas idéias ocorre em problemas em que é necessário dividir igualmente certa quantidade de objetos entre determinado número de grupos e se deve encontrar quantos objetos ficam em cada grupo e quantos restam. Um exemplo simples disso é o problema: Distribuindo 108 figurinhas entre 3 crianças, quantas figurinhas recebe cada uma delas?

Por sua vez, a idéia de medir ocorre em situações em que é preciso dividir igualmente determinada quantidade de objetos, em grupos, sabendo-se quantos elementos comporão cada grupo, precisando-se encontrar quantos grupos são formados e quantos objetos sobram ao final. Por exemplo: Quantos pacotes, com 3 figurinhas cada um, são feitos com 108 figurinhas?

Dependendo da abordagem dada à operação de divisão, os alunos resolvem somente problemas envolvendo a idéia de distribuir, porém é a idéia de medir que dá significado às divisões do tipo 20 ÷ 2,5, quando se propõe, por exemplo, o problema: Quantos pedaços de barbante de 2,5 m de comprimento é possível fazer com 20 m de barbante?

Deve ser considerado também o papel que o resto desempenha em um problema de divisão, e as três situações a seguir ilustram a importância e os diferentes significados que o resto da divisão pode ter:

1) Juliana tem cinco barras de chocolate que precisa dividir igualmente com seu irmão. Qual é a quantidade de chocolate que cada um receberá?

2) A gata de Juliana teve cinco gatinhos que ela deseja distribuir igualmente a quatro crianças na rua. Quantos gatinhos cada criança ganhará?

3) Um pequeno barco faz a travessia de pessoas de uma margem à outra de um rio. A cada viagem ele leva apenas duas pessoas além do barqueiro. Quantas viagens o barco deve fazer para levar sete pessoas até o outro lado?

Em função dos múltiplos aspectos e idéias envolvidos na divisão, constata-se que a introdução prematura de uma técnica operatória sem associá-la ao conceito de divisão no sentido da matemática e às propriedades que relacionam os termos de uma divisão entre si pode-se constituir em um sério obstáculo para a compreensão da própria técnica operatória. Por esse motivo, as atividades de introdução da divisão devem ser orientadas para a aprendizagem dos significados e relações citados até aqui.

No entanto, a própria técnica operatória pode e deve ser cuidada para ganhar significado e se tornar um instrumento utilizado pelo aluno com controle sobre a melhor e mais prática forma de fazê-lo.

Para isso, iniciar a técnica da divisão pelo algoritmo americano, relacionando as etapas desse procedimento com as tabuadas e com o cálculo por estimativa, tem a vantagem de introduzir a técnica em estreita relação com as idéias da divisão e com o significado do resto.

O algoritmo americano permite ao aluno maior controle do resultado e evita erros muito comuns, como as dificuldades encontradas quando há zeros intercalados no dividendo ou no quociente.

A estimativa em cada etapa do algoritmo americano e a estimativa do quociente como um todo mostram que a passagem do algoritmo americano para o convencional, baseado na decomposição do dividendo nas ordens do sistema de numeração, se torna muito natural para o aluno, pois ele compreende o significado do que está sendo feito e passa a optar pela forma mais prática de cálculo em cada situação.

A conta de dividir em si mesma, apesar de parte importante para aprender a divisão, mostra que o ensino deve-se estruturar para que, ao chegar o momento da técnica, o aluno tenha refletido sobre todos os aspectos envolvidos.

O que é preciso para saber fazer uma divisão não é uma questão simples nem para o aluno nem para o professor, mas que pode ser bem equacionada com um bom planejamento das ações em função de cada idéia e conceito necessários para aprender significativamente essa operação.

Humberto Luis de Jesus
Maria Ignez Diniz - Coordenadora do Mathema

1 Miguel, A., Miorim, M. Â. O ensino da matemática no primeiro grau. São Paulo: Atual, 1986.

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